Encarar o Desafio das Serras parecia uma boa opção de diversão para equipe. Uma prova de dois dias de corrida de montanha com acampamento no meio, uma prévia de começo dos treinos para a gente que vai encarar a Transrockies no ano que vem. Fechar o ano com chave de ouro e abrir a temporada dos treinos de corrida.
Poucos dias antes da competição saiu um comunicado que a prova passaria de 20 a 27,5 km por dia, ou seja, não iríamos mais correr 40 km e sim 55. Nada que abalasse a nossa vontade de encarar a montanha, muito pelo contrário.
“Quanto tempo faremos?” Eu tinha uma previsão bem otimista em relação ao nosso ritmo, a Dri já não tanto. Mas tirando a média a gente achava que o primeiro dia de prova poderia ser concluído em 5 horas e pouquinho.
São Pedro ignorou a previsão e nos mandou um incrível dia nublado e seco para largarmos, e às 9.30 na praia de Ubatumirim saímos rumo ao alto. Não demorou muito o percurso entrou em trilha no meio da mata atlântica. A mata atlântica é uma das florestas mais ricas em biodiversidade do planeta, hoje conta com várias áreas de preservação ambiental, o nosso palco era esse parque da Serra do Mar. Seguindo a nossa crença, ao entrar naquele templo, pedimos licença, proteção e agradecemos.
A mata não estava muito para brincadeira, cheia de obstáculos; cipós, raízes, troncos, lama era difícil não tomar alguns tombos. Parecia um “corredor polonês” natural, e assim a gente seguia tomando uns “prestatenção” dos bambus e bromélias, tentando nos desenroscar das armadilhas a espera a tão temida subida que demorava a chegar.
A subida era uma escalada 1300 de ascensão em 5 km. Ai o calor, o esforço começou a quebrar nossa equipe e de tempos em tempos era preciso uma paradinha para esfriar o radiador. Foi no meio da subida que entendemos porque era preciso apresentar atestado médico comprovando as condições físicas para encarar o desafio, foi no meio da subida também que entendi porque eu tinha um headlamp na mochila. Mas foi no final da subida que descobrimos que nossa previsão estava errada.
“Falta muito?”
“Não tá logo ai; vai subir mais um pouquinho descer, depois chega num descampado e logo termina.”
A nossa experiência de corridas de aventura nos tornou surdas. Aprendemos que nunca, sob hipótese alguma, podemos acreditar no “tiozinho” do percurso. E olha que ele até poderia estar falando a verdade, mas essa era a verdade dele, a nossa era bem diferente; ainda tivemos que encarar mais 10 km no meio da picada pulando troncos e atravessando rios com todo o cansaço acumulado para chegar no nosso destino final. Com 8.31 hs cruzamos o pórtico de chegada do primeiro dia, e os 27,5 km misteriosamente viraram 31,5 km. =)
Para a nossa felicidade não éramos as únicas a errarem feio o estimado tempo de prova, a encrenca era tanta que vários atletas só saíram da trilha a noite. Condições adversas, chuva, desaviso, despreparo, como o “tiozinho” da trilha, cada um tem a sua verdade. A nossa era que tanto pedimos uma prova casca aventura que ganhamos uma! A dificuldade nos encanta, o perrengue nos atrai, mesmo sabendo que o dia seguinte demoraríamos provavelmente as mesmas oito horas para descer a Serra do Mar seguiríamos firmes e felizes.
No dia seguinte a organização da prova e bombeiros chegaram a conclusão que não seria seguro manter o percurso com a madrugada chuvosa a trilha ficou ainda mais perigosa. Um novo percurso igual para quem corria as duas distâncias foi rapidamente criado, a volta teria 25 km.
Confesso que num primeiro momento ficamos tristes em saber que não encararíamos a trilha de volta e correr em estrada (metade do percurso do segundo dia) não é nada nossa praia. Mas quando percebemos que a organização estava zelando pela nossa segurança resolvemos abraçar a causa e encarar o estradão mesmo. O segundo dia foi um “passeio no parque” para quem tinha a tão dura referencia do primeiro dia.
Fomos nos divertindo sem nos preocuparmos com a classificação, e depois que chegarmos vimos que ficamos em terceiro com apenas 33 segundos de diferença no tempo acumulado para as segundas colocadas! Trinta e três segundos no tempo total de doze horas e vinte minutos? Poder competir no meio da mata atlântica? A vida é boa!
Obrigada Desafio das Serras por nos levar à esse lugar maravilhoso que sozinhas não iríamos! Obrigada ready4 pelo preparo! Suunto Brasil pelo apoio! Tomas pela maravilhosa hospedagem e leva e tráz. =)
fotos Paulo Barbosa dos Santos e Alexandre Janotti