Quinze dias sem correr desde que meu pé teve outro “pirepaque”. Decidi nem testar antes de competir.
A Lurdes fala que essas coisas acontecem para dificultar o desafio. Então toma lá; destreino somado com altitude de 1.300 m. Tá bom vai, não posso reclamar da altitude, para quem teve dois dias de aclimatação a 2.300 m.
Na retirada dos kits a organização pediu para tirar uma foto minha, já que eu carregava a bandeirinha do Brasil. A postagem deles depois rendeu boas risadas. Dizia que eu brasileira tinha trazido o samba e as batidas da Shakira para competição. A Shakira, que é colombiana. What?
O Briefing da prova explicou a logística do dia seguinte.
Para ir para largada é preciso ir com o ônibus da organização que sai de Punakha às 6:30 da manhã.
Tanto a meia quanto a maratona começam em um lugar e terminam em outro, o que torna o percurso mais incrível ainda.
A estrada (se é que dá para chamar de estrada) é daquela que já descrevi por aqui, uma serpentina no meio da montanha; duas mãos e espaço para uma.
No meio de uma beleza natural, às vezes rural incrível.
Sentei no onibus do lado de um Butanês que me explicava várias curiosidades do país, e também ao lado de duas tailandesas muito simpáticas.
“Olha; levo o país de vocês aqui no meu cabelo!” Me referindo aos elásticos coloridos com guizos com que costumo correr.
Uma hora de viagem chegamos ao pórtico montado na estrada, no meio do nada. Encontro com uma Suíça que me faz companhia pre competição.
A temperatura ainda é fria, espero até o último minuto para tirar meu casaco.
Antes de fazer a mala perguntei se seria ofensivo correr com saia muito curta, o guia me respondeu que não.
“É um evento esportivo e internacional.”
Dez minutos antes da hora de largada fui dar um trotinho para aquecer. Quando volto já tá todo mundo reunido no pórtico. A vibe é de uma prova de trail não muito cheia; os competidores são amistosos e o ambiente é de excitação.
Sem maiores cerimónias é dada a largada. Lá fui eu, no velho plano tosco e sem maturidade nenhuma correndo acima do que deveria ser meu ritmo. Sentindo falta da Si, que certeza estaria falando: “O pace tá alto. Diminui.”
Seguindo a pura empolgação! Claro que aí meu coração já disparou lá para cima, mas não consigo ter a percepção certa.
O percurso segue o rio Mo Chhu e o vale rural de Punakha. Apesar de estar correndo no asfalto, a floresta que nos cerca nos dá a sensação estamos em trilha.
A altimetria é “rompe pernas” (como dizem em Portugal) com sobes e desces. O terreno é ondulado com muitas descidas seções de colinas e com uma perda gradual de elevação.
Eu corri um bom tempo perto do meu amigo do onibus.
“Are you all right?”
Aos poucos vamos saindo de uma fenda estreita da montanha que se abre em vale; as vistas são deslumbrantes! O Templo Khamsum Yulley, mosteiros, arrozais, aldeias e stupas. Emoção!
Eu ficava igualmente comovida com a beleza da paisagem e as criancinhas no meio do percurso correndo e gritando.
“You can do it.”
Às vezes eu tinha um choque de beleza “Wow” da paisagem casado com a música da playlist da Simone. “Mana, corri tanto contigo!”
Analisando depois os dados da minha corrida percebi que quebrei no quilometro 9. Hahaha, meu tanque não chegou até o final, restou empurrar me. #planotoscofail
Além da quebra real, tive que lidar com a psicológica; no briefing disseram que teria coca cola nos pontos de abastecimento.
Foi a primeira pergunta que fiz quando passei no km 5.
“Coke?”
Nada. Segui esperançosa perguntando nos seguintes.
Sem sucesso.
Mais pra frente, nas subida eu passei a caminhar. Numa delas enquanto andava, lá do alto as criancinhas gritavam.
“Oh! You are from Brazil!”
“Neymar! Neymar! Run like Neymar.”
Depois desse incentivo, claro que voltei a correr. Ali, ainda faltava metade da prova.
Aí vem o clímax do nosso percurso; a travessia da ponte. Que lugar mais maravilhoso! A Ponte Pênsil de Punakha, é a mais longa do Butão, com 160 metros de extensão e 30 metros sobre o rio Po Chhu. Atravessar correndo é divertido e desengonçado uma vez que a ponte balança e nossas passadas se atrapalham. Ali encontrei com a minha amiga Tailandesa, que depois me passou num pace certinho.
Depois da ponte o percurso seguia em terra batida. Lá pelo quilometro 19 o último ponto de água.
“Coke?”
Com a resposta negativa, peguei a água que eles me deram e virei inteirinha na minha cabeça para ver se voltava a vida. Percebendo meu desespero e um deles saiu correndo até o carro e voltou com uma garrafa já aberta.
“Pode levar!”
Nossa, imagina minha felicidade. A Coca serviu para dar uma animada no trecho final que ainda tinha subida. E olha que a última já estava ao lado da chegada mas as minhas forças só voltaram quando vi o pórtico: lotado de crianças e de torcida. Barulhento e animado. Com duas horas e doze de prova cruzo a meta, em decimo terceiro lugar entre as mulheres.
Eu costumo dizer que o sofrimento enaltece a beleza. Com a quebra, as vistas ficaram mais coloridas, as dezenas de high fives compartilhados com as crianças emocionaram mais, o presente Coca cola teve um sabor mais que especial e a medalha.
Ah, a medalha, termina por concentrar e concretizar a vivência numa mandala dourada. Quando ela estiver do outro lado do planeta terá sempre o poder de me teletransportar ao país da felicidade! Mindful miles! Thank you Buthan!
Privilegio maior ter minha mãe no final para assistirmos juntas todo o ritual de danças tradicional de entrega de prémios!
Life is good!
4 Responses
Luliiiiii! que relato super vibe e lindas imagens! amei
Demais né Fabi?! a vibração estava mesmo espetacular!
O Carlos seria a pessoa ideal para te levar a coca em garrafinha de vidro como gostas😁
Tu desafias todas as probabilidades e improbabilidades , não tem pé dorido que te pare, porque atrais a luz, sorrisos e plenitude para ti♡
Te amo mana!
Lindas as paisagens e muito linda a medalha!! 😀